Já repararam como a Constituição Federal do Brasil vem sendo emendada e remendada repetida e cotidianamente? Quais seriam as consequências disso?

A nossa Constituição é chamada “cidadã” por trazer vários direitos e garantias individuais e coletivos ali enumerados. Também é considerada frágil por possuir o grave defeito de tratar não somente dos direitos fundamentais e da formação orgânica do Estado, mas por também avançar em pormenores que escapam da essência fundamental. Sua fragilidade advém exatamente daí: ao tratar extensivamente de assuntos que seriam muito mais adequados às leis ordinárias, pretendendo ser forte na garantia de direitos, acaba sendo fragilizada pela vulgarização das inevitáveis revisões e emendas ao seu texto.

Em países cujas constituições são seculares, seus textos tratam exata e somente daquilo que importantemente interessam ao contrato social de geração de suas respectivas nações. Para citar um exemplo, muitos de nós, mesmo os não iniciados na doutrina jurídica, já ouvimos falar da famosas 1ª e 5ª emendas à Constituição dos Estados Unidos da América. Foram editadas sobre temas graves e solenes e que constituem interesses perenes daquela sociedade. Tais emendas são famosas, exatamente por isso: porque traduzem solenemente o momento raro, singular e fundamental de consolidação da vontade democrática de seu povo.

No Brasil, atualmente, a profusão de emendas à Constituição se transformou numa vulgarização excessiva do interesse revisionista;. isto sem somar as incontáveis propostas de emenda à constituição (PECs) em tramitação no Congresso. Percebam que, quando emendamos uma constituição, é como se novamente reformulássemos nosso pacto constituinte. Daí, das duas uma: ou não a constituímos bem, ou não estávamos maduros para aquelas ideias. Se não a constituímos bem, é porque inserimos ali o que não devia ou da forma que se devia; Se não estamos maduros para aquelas ideias, é indicativo de que muito do que foi posto ali definido, não era exatamente a melhor decisão.

A pauta do congresso já esteve trancada no que diz respeito às PECs em andamento, por conta da intervenção federal na área de segurança do Rio de Janeiro e em muitos outros momentos. Os parlamentares agem como se administrar o Estado fosse produzir emendas à constituição, e não em obedecer administrativamente ao que ela já comanda. Se não dá para administrar o Estado com o que está disposto na constituição que o instituiu é porque esse Estado foi mau formado em sua carta constituinte.

Muda-se a regra do jogo a todo momento – e com o jogo em andamento. É por tal motivo que o STF vem proliferando decisões de caráter constitucional vem sendo repetidamente demandado por questões não pacificadas nas instâncias inferiores. Daí, o poder judiciário, temerariamente, vê e revê suas próprias decisões, ao sabor da interpretação dos ministros do STF, diante de uma Constituição fragilizada. Assim foi e está sendo no vai-e-vem sobre as questões da prisão em segunda instância, sobre o foro privilegiado e muitos outros temas. O judiciário inova e praticamente legisla em lugar do poder republicano constituído para isso na tripartição dos poderes formadores do Estado. Talvez, exatamente porque nossa Constituição diz demais, sobre assuntos pormenorizados e transitórios que ali não lhe competem detalhar. E acaba, por isso mesmo, fragilizada: Quem fala muito dá bom dia a cavalo!

Diante de toda essa instabilidade constitucional é possível prever que, muito brevemente, uma nova assembleia constituinte será formada e toda nossa constituição será remontada. Vamos ver se dessa vez acertamos.

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